domingo, 5 de dezembro de 2010

ITACARANHA "DE CIMA"

Nos mudamos para a Rua Rio Madeira, 19-E, Itacaranha, mais precisamente numa encruzilhada. A nossa casa ficava de esquina com a Rua Sergi Mirim, que dava no Colégio Clériston Andrade onde estudei da 4ª a 6ª série. A casa era ampla, maior do que a que tínhamos na Rua da Estação. Além de tudo tinha um número, 19-E. :D. A rua não era asfaltada, era uma estrada de cor clara, pois predominava um solo arenoso. Andávamos sempre descalças, o que era maravilhoso. Só fui usar sandálias, obrigatoriamente, por causa do asfalto, muitos anos depois.

A casa era toda cercada por varanda feita de telha de eternit, mas o telhado da casa era feito de telhas de cerâmica (depois do trauma, minha mãe não queria ouvir falar das telhas de eternit). A área da varanda era cimentada, com cimento vermelho, com aproximadamente 2m de largura. O quintal era murado e não era plano. Era aberto, sem plantas, árvores e por isso fazia muito calor. Lembro-me dos dias ensolarados, do calor vindo daquele chão arenoso logo quando fomos morar lá. Ainda bem que meus pais escolheram um dia assim para mudança.

Era uma linda casa!

A casa ficava em frente a um campo de futebol que margeava com uma lagoa, chamada de Lagoa Dourada. Era uma lagoa mágica de onde nasciam capins. Não entendia como da água nascia capim. Ouvíamos sapos coaxarem e grilos a criquilar sempre quando, à noite, íamos brincar de "cabana" ou "coelhinho sai da toca", brincadeiras de correr, parecido com picula, mas com direito a posse daquele que se pega, confinado a uma "cabana" ou "toca".

Lá faltava muita energia e água também. Por isso, meu pai pediu para fazer uma "fonte" que, diferentemente da casa da Rua da Estação, tinha água de qualidade. Algumas pessoas, vizinhas e amigas, iam pegar água lá em casa. Com o tempo, fomos plantando e muitas árvores floresceram naquele quintal, mas sobre elas dedicarei uma postagem especial. Quando "faltava luz", brincávamos de fazer sombra na parede com os "fifós" acesos à base de querosene. Meu pai contava estórias de assombração.

A ponte MMMMMMMMMMMMMM

A ponte não ficava exatamente em Itacaranha, mas entre Plataforma e os Alagados, mas é impossível não se lembrar da ponte "MMM", por onde os trens passavam com destino a Estação da Calçada. A ponte "MMM" (lê-se: mêmêmê) era assim chamada por nós porque tinha a forma da letra "M" e toda a vez que o trem passava por ela, fazia um eco que parecia pronunciar a letra "mê" ininterruptamente. Era como se a ponte falasse, com uma voz grave e ecoante.

Assim que o trem começava a cruzar a ponte, ouvia o primeiro eco, ritmado e retumbante pronunciando "mêmêmêmêmêmê". Era tão divertido que também pronunciava baixinho, seguindo o mesmo ritmo, o som emitido. Às vezes falava baixinho pra ninguém ouvir, outras vezes, caso estivesse com as minhas irmãs, falava alto, alegremente. Criança sempre se diverte com coisas aparentemente banais para os adultos.

O poço de óleo



Uma das coisas inesquecíveis naquela ida a estação do trem era um quadrante cheio de óleo sobre o qual os trilhos do trem passavam. Muitas pessoas, para não pagarem a passagem, se arriscavam a passar por cima dos estreitos trilhos, embora não soubéssemos a profundidade daquele "poço". Na minha imaginação, funcionava como uma "areia movediça" (como nos filmes de Tarzan), e que, uma vez caindo naquele óleo, não sairia mais. Eu não me lembro de ter passado por ali, em busca de alguma aventura, mas me lembro do tamanho do quadrante (na minha imaginação de menina, era grande) e de sua textura. Era oleoso, escuro e sujo, qualquer coisa misteriosa e perigosa que, naturalmente, só poderia aguçar a minha imaginação.

O Chafariz

Havia um chafariz próximo à nossa casa. Lembro-me que íamos cedo, antes de meu pai se aprontar para o trabalho. As lembranças me trazem imagens de muitas mulheres com crianças, conversas, barulho da água caindo forte dentro das vasilhas e a minha preocupação com o desperdício, pois não havia torneira, a água era corrente, havia apenas uma canalização para que não se espalhasse. Era uma disputa para quem colocava primeiro, pois a visão que tenho é de latas (de galão de tinta) velhas, com uma madeira entre uma extremidade e outra, entrechocando-se. A água era limpa, cristalina. As mulheres enrolavam as rodilhas de pano e colocavam na cabeça. Observava com que força descomunal levantavam uma lata daquele tamanho na altura da cabeça, todos os dias. Meu pai fazia isso, e aquelas mulheres faziam o que meu pai fazia. Eu tinha uma vasilha pequena mas meu pai nos levava assim mesmo. Eu não sei se a minha irmã mais velha se lembra destes momentos. A verdade é que não fui muitas vezes lá.